Colar de âmbar: atualizações
Quem é assíduo em mídias sociais de temática materno-infantil já deve ter lido posts sobre o posicionamento contrário ao uso do colar por diversas Sociedades de Pediatra – isso devido ao risco de estrangulamento e à falta de evidências sobre possíveis efeitos benéficos. Mesmo assim, a busca por mais informações referentes ao colar de âmbar, bem como a procura por vendedores do colar na internet tem aumentado em vários países (incluindo o Brasil) nos últimos anos. E o que temos de novidades na área?
Uma pesquisa publicada no mês passado demonstrou que de fato em amostras analisadas de colares de âmbar com origem báltica foi possível observar a presença de ácido succínico, o agente ao qual se credita as propriedades anti-inflamatórias do âmbar. Porém, em uma série de testes simulando a condição fisiológica da pele humana (de temperatura e pH), não foi observada liberação desse componente das pedras. Vale lembrar que o ponto e fusão do âmbar é próximo a 300 graus Celsius. Mesmo assim, os pesquisadores avaliaram se diversas concentrações de ácido succínico poderiam exercer um efeito anti-inflamatório em culturas de macrófagos, um tipo de célula do sistema imune humano – e não encontraram efeito algum! Aliás, na concentração mais alta que foi testada, foi observado um pequeno efeito – porém, com essa concentração tão alta de ácido as células na verdade estavam morrendo.
De uma forma geral, os argumentos científicos que temos até aqui nos demonstram falta de evidências dos efeitos benéficos do âmbar, relatos de estrangulamento em bebês e colonização do colar por bactérias (que embora não sejam patogênicas, podem causar problemas em situações específicas).
Apesar de tantos fatos contrários ao uso do colar, existem muitas pessoas na internet relatando seu efeito positivo. Uma enquete na França já demonstrou que para grande parte dos pais, a angústia em ver os filhos sofrendo com o nascimento dos dentes ultrapassa o medo de um possível risco de estrangulamento com o uso do colar. É claro que esses relatos pessoais de benefício não valem como ciência, até porque não há nenhum estudo controlado e randomizado demonstrando que bebês usando o colar sentem menos dor ou têm o sistema imune mais eficiente. Será que esse alívio não é apenas uma percepção dos pais e ação do famoso efeito placebo?
Para quem quer fazer uso do colar de âmbar mesmo assim – seja acreditando nos relatos pessoais de benefícios ou apenas por razões estéticas, é importante tentar verificar as condições em que esse âmbar foi extraído da natureza. Os maiores depósitos mundiais de âmbar estão localizados na região Báltica, em Myanmar e na República Dominicana. O âmbar Báltico e da República Dominicana possui cerca de 40 milhões de anos, e as minas existentes em Myanmar possuem cerca de 100 milhões de anos. Através da análise e da comparação dos ecossistemas encontrados fossilizados no âmbar, os pesquisadores conseguem entender melhor como se deu a evolução e a extinção de diversas espécies. Recentemente foram reveladas condições de trabalho desumanas em minas de âmbar em Myanmar, que vão desde trabalho infantil até a morte de dezenas de trabalhadores em acidentes. Além disso, a exploração do âmbar acaba também alimentando a exploração da comercialização de fósseis, podendo inclusive atrapalhar pesquisas científicas na área de paleontologia. O ideal realmente seria que fabricantes do colar pudessem certificar não somente a origem do âmbar, mas também boas práticas de extração da natureza.
Referências para quem quer saber mais:
Nissen MD, Lau ETL, Cabot PJ, Steadman KJ. Baltic amber teething necklaces: could succinic acid leaching from beads provide anti-inflammatory effects? BMC Complement Altern Med. 2019 Jul 5;19(1):162. doi: 10.1186/s12906-019-2574-9.
Machet P, Lanotte P, Giraudeau B, Leperlier M, Tavernier E, Maruani A. Amber necklaces: reasons for use and awareness of risk associated with bacterial colonisation. Eur J Dermatol. 2016 Dec 1;26(6):580-585. doi: 10.1684/ejd.2016.2871.
Soudek L, McLaughlin R. Fad over fatality? The hazards of amber teething necklaces. Paediatr Child Health. 2018 Apr;23(2):106-110. doi: 10.1093/pch/pxx158. Epub 2017 Nov 28.
Cox C, Petrie N, Hurley KF. Infant Strangulation from an Amber Teething Necklace. CJEM. 2017 Sep;19(5):400-403. doi: 10.1017/cem.2016.342. Epub 2016 Aug 9.
The Human Cost of Amber. Gammon K. Agosto de 2019. Disponível em: https://www.theatlantic.com/science/archive/2019/08/amber-fossil-supply-chain-has-dark-human-cost/594601/